sábado, 27 de junho de 2009

AUTORIA DO ZÉ MÁRIO - UM BELO TRABALHO

(Polêmica)
Diploma de Jornalismo: ter ou não ter, eis a questão...

A discussão acalorada em torno da recente decisão judicial que fulminou a exigência do diploma de jornalismo tem justa motivação. Mas não se pode dizer que a razão toda esteja com os profissionais inconformados nem com o voto vencedor dos Ministros do Supremo que decidiram pelo fim da exigência. Isto porque, numa sociedade que se queira livre e democrática, algumas considerações a respeito são necessárias para a compreensão do tema, não na superficialidade –como fazem muitos, inclusive invocando a condição de serem profissionais da imprensa de longa data–, mas na sua essência.

Para início de conversa, é bom que se diga que a decisão não significou, nem de longe, o fim do diploma de jornalista. Ele continua existindo, assim como os cursos mantidos pelas instituições regularmente reconhecidas pelo Ministério de Educação e Cultura, que procuram formar profissionais competentes para um mercado que se apresenta promissor diante da multiplicidade de mídias hoje colocadas à disposição daqueles que precisam ou desejam se manter bem informados.

A profissão, à exceção da revogação do artigo sobre a exigência de diploma pelo Supremo Tribunal Federal, está regrada por uma verdadeira salada de dispositivos legais: um Decreto-Lei, uma Lei, um Decreto e agora um Acórdão.

A primeira norma cuidando da profissão foi editada em pleno regime de exceção, ou seja, pelo Decreto-Lei nº 972/69, de 17 de outubro de 1969. A excrescência –decreto com valor de lei– perdura por 40 anos (que se completam daqui a três meses), assinado pelos Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, dispôs sobre o exercício da profissão de jornalista.

Basicamente, esta lei promoveu uma verdadeira “reserva de mercado”, dizendo praticamente que toda atividade numa redação dever ser exercida por jornalista, mesmo a de um simples arquivista de documentos ou ilustrador. Ainda assim, dispôs também sobre a figura do colaborador e permitiu o estágio para os alunos do último ano do curso de jornalismo.

A segunda norma a cuidar do assunto, a Lei Federal nº 6.612, de 07 de dezembro de 1978, basicamente tratou de restringir a figura do colaborador, que não mais poderia se manifestar sobre qualquer assunto, como previsto no Decreto-Lei, mas apenas produzir “trabalho de natureza técnica, científica ou cultural”, relacionado com a sua especialização, “para ser divulgado com o nome e qualificação do autor”.

A mesma lei ainda eliminou a possibilidade de o aluno de jornalismo atuar como estagiário, no seu último ano de formação, como complemento do ensino ministrado em sala de aula.

Ao restringir a atividade do colaborador e eliminar a figura do estagiário, quis a lei apenas atender ao pleito de jornalistas ávidos por uma reserva no mercado de trabalho que lhes garantisse melhores ganhos, ainda que isso significasse silenciar vozes capazes de discutir determinadas matérias em sentido mais amplo, e impedir a salutar prática do estágio – que, diga-se de passagem, existe em praticamente todos os bons cursos superiores, pelos resultados positivos que oferece ao aluno, preparando-o e lapidando seus conhecimentos com atividades práticas que somente contribuem para o seu aperfeiçoamento profissional.

A terceira norma, o Decreto 83.284/79, de 13 de março de 1979, apenas regulamentou a Lei 6.612, explicitando a forma de sua manifestação e aplicação no mundo fático.

Por fim, o Acórdão do Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento de 17 de junho de 2009, revogou o artigo 4º do mencionado Decreto-Lei 972/69, que dispõe sobre a exigência do diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido, como condição para o registro no Ministério do Trabalho e Previdência Social – o sonhado número do MTB.

Os ministros aceitaram o recurso extraordinário apresentado pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo e pelo Ministério Público Federal contestando um acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que afirmou a necessidade do diploma, contrariando decisão de primeira instância em ação civil pública. O Ministério Público Federal sustentou que o Decreto-Lei 972/69, que estabelece as regras para exercício da profissão de jornalista, incluindo a obrigatoriedade do diploma, não é compatível com a Constituição de 1988.

A decisão do Supremo, de fato, externou aquilo que a Constituição Federal de 88 traz em seu artigo 5º, inciso IV: a livre a manifestação do pensamento. E nem poderia ser diferente. Este artigo, aliás, é transformado em cláusula pétrea por força do disposto no artigo 60, § 4º, IV. Um dispositivo, portanto, insuscetível de ser modificado por emenda constitucional.

Inúmeras exigências bisonhas há na lei que regula a profissão de jornalista, com certeza. Não se pode concordar, por exemplo, com limitações como a que foi imposta à figura do “colaborador”, restringindo o seu trabalho a assuntos específicos de sua área de atuação científica, técnica ou cultural, silenciando-o em assuntos gerais. Assim, por exemplo, o advogado, para abordar temas jurídicos –e publicá-los num periódico– teria primeiro de se registrar como colaborador, cumprindo uma via crucis para isso. E não poderia, em hipótese alguma, abordar temas gerais de interesse coletivo. Sua condição não o permitiria.

Em outras palavras: se não é colaborador registrado não pode se manifestar na imprensa. Um absurdo, já que o profissional goza de prerrogativas próprias de sua atividade. No caso, poderia ele pleitear até perante o Supremo Tribunal Federal, utilizar-se de todos os argumentos de defesa, mas não poderia escrever um simples texto em jornal. Uma estupidez, certamente, já que para publicar um livro inteiro ninguém precisaria estar registrado em lugar algum.

Também não se pode aceitar a proibição de que o curso de jornalismo tenha alunos estagiários em órgãos de comunicação no seu último ano letivo. A falta de estágio apenas prejudica o formando no momento em que não permite o contato com o dia a dia das redações, aparando arestas e sedimentando conhecimentos. Ao que parece, esta vedação apenas quis deixar o recém-formado em condições desfavoráveis diante de veteranos na hora de demonstrar um bom trabalho e concorrer livremente no mercado.

Quer mais bizarrice da lei? O teor do artigo 8º do Decreto 83.284/79, que permite que pessoas com nível de segundo grau, chamadas “provisionadas”, sejam registradas para escrever em periódicos como se jornalistas fossem. Condiciona, porém, que sejam moradoras em localidades onde não haja curso específico de formação profissional e que –pasme-se!– não exista um jornalista sequer desempregado na cidade. Neste caso, caberia ao sindicato da categoria averiguar e informar sobre a existência ou não de profissional, domiciliado no município, disponível para contratação. Nesta situação, não se precisaria de diploma algum. De novo, uma vedação incompreensível de acesso ao mercado de trabalho.
Outra bizarrice é o tratamento diferenciado dado ao interessado em se registrar que seja ocupante de cargo público ou de função pública. Exige, além da apresentação do ato de nomeação ou contratação em que constem atribuições típicas de jornalista, também o diploma do curso, como se o funcionário público fosse uma maldição qualquer a ser enfrentada com uma cautela maior. Ora, para se registrar, não bastaria a apresentação do diploma de jornalismo? Pior ainda: ao se registrar, já não estaria exercendo clandestinamente a profissão?
Todavia, evitar os extremos é preciso, na busca do meio termo, do equilíbrio, do consenso. Nem tanto cá nem tanto acolá. Por isso é necessário, não a extinção do diploma de jornalista, mas que seja elaborada uma legislação moderna, que concilie o exercício da profissão com a total liberdade de expressão a quem quer que seja. Será um avanço, sem dúvida. A atual legislação, gravada com o ranço da ditadura, se apresenta caduca e descompassada com a realidade. Exigências ridículas como as apontadas apenas expõem as vísceras de uma nobre profissão e atenta contra os interesses de uma sociedade sedenta de informações precisas e eticamente elaboradoras para se desenvolver.

Forçoso é reconhecer que um jornalista que tenha na sua bagagem ensinamentos técnicos e sólidos a respeito do exercício da profissão, principalmente no que respeita à ética que deve direcionar toda a atividade do formador de opinião, será sempre uma salvaguarda maior para o meio social em que ele desempenha as suas funções ou em que esteja inserido.

Sem dúvida que o profissional saberá melhor que ninguém interpretar os fatos do dia a dia e os fenômenos sociais que se passam ao derredor, fixar seu entendimento e repassar à comunidade as informações de modo preciso e responsável. Neste aspecto, aquele que não freqüentou os bancos escolares terá dificuldades para levar adiante, com a qualidade desejável, a mensagem que possa implicar o crescimento mental e crítico do leitor ou destinatário do conteúdo informativo.

É neste ponto em que o diploma de jornalismo faz a grande diferença e pesa em benefício dos detentores de formação acadêmica. Logicamente que existirá sempre o bom e o mau profissional, tenha ele freqüentado uma faculdade ou não. Ninguém pode negar a capacidade de alguém que a vida toda se tenha empenhado na arte da comunicação escrita, falada ou televisionada, vivendo o dia a dia dos pequenos, médios e grandes veículos de comunicação. Não é porque se trata de pessoa formada em faculdade que o trabalho será excelente – o inverso também é verdadeiro. Neste caso, caberá ao mercado fazer a seleção e apontar os melhores.

Da minha parte, concordo plenamente com a liberdade de expressão a mais ampla e plena quanto possível, conforme decidiu a mais alta Corte do País. Isso contribui diretamente para a existência efetiva do estado democrático de direito, em que as informações, assim como a imprensa, nascem e se mantêm livres. Mas, como estudante de Jornalismo, não é essa decisão que vai demover de mim o interesse de continuar freqüentando o curso.

Quero ser um bom profissional. E isto me basta.


Zé Mário - de Caraguatatuba
2º ano de Jornalismo/Unimódulo

----------------------------
José Mário Silva – RG 10.417.287/SP (fone: 12-3883-2240) - Autorizo, se houver interesse, a publicação total ou parcial, a supressão ou a condensação de textos.

Um comentário:

  1. Na verdade, sabemos que o governo tem tantas outras coisas pra levar em consideração a começar pela saúde, educação e segurança pública, que outros assuntos seriam como para desfocar o problema. É de muita importância o diploma dos jornalistas sim, como em qualquer outra profissão, isso significa ser e ter qualificado para o devido trabalho , isso é cultural. Não sabemos tudo, nem conseguimos ter dons para todas as coisas, por isso estão aí os cursos universitários. Os colaboradores são importantes pois podem ser motivos, criticos, etc das reportagens. Vamos focar no que realmente precisamos, saúde, educação. Aí sim teremos uma verdadeira democracia.

    ResponderExcluir

IDENTIFIQUE-SE